Sabe aquele preconceito com a literatura brasileira de que todos os livros são chatos? Pois é, foi justamente o que eu senti quando tive que ler “Terra Papagalli”, obra de José Roberto Torero e Marcus Aurelius Pimenta, publicado em 1997 no campo fictício. Pois bem, sabe esse preconceito? Ele foi quebrado. O livro me surpreendeu. Para quem esperava uma narrativa chata – vulgo eu – o mesmo quebrou todos os paradigmas e superou as minhas expectativas. O livro trata sobre o “descobrimento” do Brasil através de 134 páginas, com uma leitura leve e fluente.
O
começo é bem light, se assim posso
dizer, o personagem principal, Cosme Fernandes, apresenta-se através da
narrativa sobre seus pais.
Pág. 9 |
“Ah,
um rapaz de família humilde!”, você pensa. Ele foi a
um primeiro momento, entretanto, seu pai começa a se envolver com comercio
fazendo um sucesso danado que chega,
até mesmo, a mudar de cidade. Cosme nasce antes de seus pais desembarcarem na
nova cidade. “Hm, menino nasceu no mar.
Filho de Poseidon”, mas calma aí! Aqueles (as) que são fanáticos por
mitologia grega e já tendem a querer ler as entrelinhas de tudo. Esse livro não
se trata sobre estórias mitológicas e sim, sobre a “descoberta” do Brasil.
Sua família é de Judeus, fazendo-os sofrer
preconceito, a moral da época era ser cristã. Sua família fora denunciada e
então utiliza de Cosme para provar a sua lealdade ao cristianismo, colocando-o
num seminário.
Observe a confusão que começa por aí. Cosme nunca
foi fã de aprender Latim, entretanto o estudava, seu professor se chamava Magister (em Português significa Mestre) Videira,
como gostava de ser chamado. Convencido, não?
Magister também era um confessor e ao levar Cosme
para a casa de uma nobre família para uma confissão, o mesmo compreende o
porquê de seu professor ir visitar uma família a milhas de distância: A comida.
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Fonte: Giphy |
Pois sinto lhes dizer, mas vocês
não são os únicos loucos por ela.
Pág. 11 |
Em certo
momento Cosme fica a sós com a filha do Senhor Fidalgo, chamada Lianor.
Prepare-se para a parte cômica. A menina sofreu uma desilusão amorosa – quem nunca? Snif –
e se abre de repente para Cosme. Ele fica até mesmo constrangido por sua falta
de reação. Também, né! Uma estranha do nada vem derramar suas angústias em cima
de você, não é para menos. Lianor diz que Cosme é muito parecido com seu sumido
amado e se insinua para ele.
Sinceramente, a achei bem estranha. A menina devia
estar muito sozinha pra se jogar assim no primeiro macho que aparece (😂😂) .
Os dois fazem tico-tico no fubá, se é que você me entende (
͡° ͜ʖ ͡°), e juram lamúrias de amor. Pergunto-me de onde esse
amor surgiu tão assim do nada. Num momentos são meros desconhecidos, no outro
Lianor insinua-se, Cosme não resiste e BUM!
Um amor explode.
Se hoje em dia fosse assim, estaríamos cheios de homens e
mulheres apaixonados. Entretanto não vamos nos esquecer da moral e costumes da
época, as pessoas não eram tão abertas
iguais às hoje em dia.
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Fonte: Giphy |
Cosme vai embora e sofre de saudades da sua, tão
recente, amada. Em um belo dia, o mesmo é chamado para a sala de Magister Videira. E aí você pensa: “Eles
descobriram!”. Calminha aí meu (inha) amigo (a), leia e veja que foi bem pior
que isso.
Cosme entra em desespero pensando o mesmo que você pensou:
Ele foi descoberto. Começa a pensar que Lianor neste momento deve estar
sofrendo, sendo açoitada, entre outros castigos.
Pág. 14 |
Cosme começa a dizer que a culpa é dele, pede
desculpas, diz que se deixou ser levado pelo Diabo, assumindo a culpa toda para
si.
Um momento de silêncio.
Porém, Cosme fora chamado na sala para justificar o
porquê de somente haver onze biscoitos na cesta, da volta da casa do Senhor
Fildalgo, ao invés de doze.
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Fonte: Giphy |
Poooois
é,
o riso é livre e nessa parte eu não tive como conter-me. Cosme mostra que é
gente como a gente, Brasil! Precipitando-se, o próprio se entregou! Ele foi lerdo o suficiente para isso. Vemos que
as pessoas que não estão acostumadas a mentir, na primeira batalha se entregam.
Já dizia minha mãe “Veja mais e fale de menos”.
Tadinho de Cosme, será que os pais dele não disseram isso? Se tivessem,
talvez, ele não se entregaria tão facilmente. E essa confusão o levou para o
desastre total. Foi preso, quase morto e condenado aos piores dos tratamentos.
O desenrolar do livro ocorre de formar natural.
Admito que houve momentos em que a leitura se torna cansativa e marasmática,
porém o livro é uma caixinha de surpresas. Em determinado momento Cosme parece
um menino ingênuo para certas situações, toda via, com os acontecimentos em sua
vida ele começa a adquirir malicia, entretanto essa característica não o livra
de certas surpresas na vida.
Quando é designado para ir as Índias como
prisioneiro e sua tripulação acabam por "achar"
o Brasil, Cosme faz amizade com um grupo de prisioneiros, o mais marcantes de
todos fora Lopo de Pina, homem proprietário de uma personalidade humorística a
qual coloca apelidos em todos. Foi preso acusado de ter matado o próprio irmão
sem querer ~Como assim?~ Pois é,
cismei com ele, achei muito estranha a história de como o mesmo matou seu
próprio irmão. História digna de ser um dos romances, não preenchendo
exatamente a categoria, trágicos de Shakespeare. Lopo foi a pessoa que Cosme
mais se aproximou.
Depois de meses no mar, vários dramas e um amor
persistente por Lianor , Cosme e a tripulação do navio declaram “Terra à Vista”. Terra essa que Cosme temeu até o ultimo fio de cabelo. Ôh homem frouxo! Depois de um contato
com os nativos decidiram por deixar alguns homens nessas terras pertencentes a
Portugal com a desculpa de que aqueles que ficavam eram invejados por todos. Porém
Cosme não pensou desse jeito, ficou temeroso, pedia a Deus que não fosse
escolhido, mas é como diz o ditado: Vamos
fazer o quê, né mesmo? E lá foi ele e seus companheiros em direção à terra.
Pág. 32 |
Os índios, bastante inocentes, aceitaram em um
segundo momento aqueles homens em sua vida de bom grado através da troca de
presentes “bobos”. Cosme e seus companheiros
cresceram naquela terra, adquiriram experiências as quais em alguns momentos se
felicitavam por ali estarem e em outras lamuriavam. As mulheres muito
inocentes, e deslumbradas pelos homens brancos, se ofereciam. E como falei
anteriormente, o livro é um caixinha de surpresas. Por mais que em alguns
momentos a leitura se torne cansativa, coisas interessantes estão por vir. Cosme
supera seu amor por Lianor e chega a ter filhos com uma das índias, também
alcançando um certo nível de poder na tribo. Entretanto, acredite, essa não é a
maior surpresa do livro. Tãtãtãããã!
~Efeito dramático~
Os autores do livro apresentaram uma narrativa bem
descritiva, com poucos diálogos e muitas explicações sobre os fatos decorridos. Na obra retratada temos um narrador-personagem o qual organiza suas ideias em tempo psicológico, variando o seu espaço, tempo e, até mesmo, os personagens de acordo com o desenvolvimento da trama. Impressionei-me pelo fato de não ocorrerem mudanças de estruturação do texto,
uma vez que a obra foi elaborada por duas pessoas. O livro fora escrito como
uma forma de informar e criticar a tal “descoberta” do Brasil. O mesmo, ainda
nos faz analisar as heranças corruptivas que adquirimos e levamos ao longo dos
anos. A analogia à facilidade de enganar e ser enganado é sempre persistente e
é abordada através dos “Dez Mandamentos
Para se Bem Viver na Terra dos Papagaios”.
Além disso, temos o retratamento de uma Portugal em
processo de transição. Num primeiro momento Cosme é julgado por seu ato,
considerado um tabu para aqueles que o julga, retratando o Classicismo. O mesmo
traz a razão acima dos sentimentos, onde o amor deve ser sublime, espiritual e
não físico de acordo os ideias divinos, o tão falado Teocentrismo. Em outro
momento Cosme é levado em direção as Índias, dessa forma temos uma mudança de
rumo, entra em cena o Humanismo, no qual o homem procura o poder, ascendendo os
ideais burgueses, tornando o homem o centro de tudo, o tão conhecido e
praticado Humanismo.
Na atualidade não nos afastamos do ideal Humanista,
tudo o que procuramos a todo momento é o poder. Talvez por pura luxúria ou
por ser a única forma de sermos ouvidos. Afinal, alguém já viu, de fato, a
classe mais baixa ter voz? Ela pode tentar, mas no fim a vitória é dos
poderosos que manipulam a tudo e a todos, que camuflam o que vemos e
consequentemente tudo se torna ilusão. Nessa terra não há nada que não possa
ser comprado.
“E
o resumo de meu entendimento é que naquela terra de fomes tantas e lei tão
pouca, quem não come é comido.”
-
Cosme Fernandes, Décimo Mandamento Para Bem Viver Na Terra Dos Papagaios.(Terra Papagalli, pág. 126)
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